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Modelos de avaliação (e algumas opiniões inevitáveis!)


Uma das discussões eternas entre professores: como mensurar a eficiência do ensino? Se existem tantas críticas a respeito dos modelos tradicionais de provas, então quais seriam as alternativas viáveis para avaliar um aluno?


Uma coisa é fato: as avaliações, provas, testes e seleções são presentes e determinantes em nossas vidas. Além das mais famosas e tradicionais provas escolares, nossa trajetória pessoal e profissional é recheada de situações avaliativas. É preciso passar por um teste - ou mais de um - para conseguir um emprego ou para estar apto a conduzir um carro. Somos avaliados até para alugar um imóvel ou para viajar para algum país diferente do nosso - quem já tirou algum visto mais burocrático sabe como é isso. Enfim, situações avaliativas estão por aí o tempo todo, e considerando o modelo competitivo em que vivemos, elas continuarão por aí por mais um bom tempo.Então talvez o desafio seja tirar o melhor deste contexto.


Com estas considerações, sou a favor de uma educação escolar que priorize a PREPARAÇÃO dos alunos (cidadãos) para saberem EXPERIENCIAR estas situações avaliativas.


Por experienciar entende-se:

  • preparação técnica para que eles dominem o conteúdo a ser avaliado

  • preparação pessoal para aspectos inerentes ao contexto de prova: saber lidar com tempo, saber lidar com distrações no momento da avaliação, ergonomia, etc.

  • preparação psicológica. Exercícios de respiração, maneiras de controlar sintomas de nervosismo, etc.

  • aplicação e valorização justa de avaliações com foco em diferentes habilidades e capacidades (escrita, oral, prática)

  • aplicação e valorização justa de diferentes formas de avaliação (diagnóstica, formativa, somativa, dialógica,etc)

  • simulação de provas como exercício de treinamento na preparação de alunos para testes específicos (exames de proficiência, entrevistas de emprego, etc)

Não é fácil, mas é possível! Lembre-se que há uma diversidade enorme de contextos escolares e educacionais diferente dos tradicionais.


Isso tudo para justificar que neste contexto de preparação (consciente e humana) dos alunos para o mundo eu sou muito a favor da aplicação de provas tradicionais como parte do processo de avaliação, mas entendo que elas são apenas uma das ferramentas que podem ser utilizadas no processo avaliativo. Elas devem fazer parte de uma estrutura muito mais completa e complexa.


Uma coisa que chama a atenção neste tipo de discussão é que muitas vezes observo professores que clamam para que novos modelos de ensino e novas configurações de aula sejam aceitos nas escolas tradicionais, mas quando chega na hora da avaliação a valorização de um modelo tradicional é muito maior, o que torna incoerente o processo de ensino aprendizagem como um todo. Se há mudança na forma de ensinar deve haver mudança na hora de avaliar.


Outro ponto de atenção é a valorização de cada prova durante o processo de ensino. Do que adianta uma proposta que aglutine vários tipos de avaliação mas que somente uma delas é valorizada na hora de criar um feedback ao aluno? Mas se a aplicação das provas tradicionais é uma das ferramentas, quais são as outras? Quais outros modelos de avaliação posso utilizar? Por que é necessário utilizar outros modelos de avaliação?


São muitos os modelos avaliativos e principalmente as nomenclaturas para cada um deles. Aqui vou apoiar-me nos estudos de Bloom e dividi-las em três funções: diagnóstica, formativa e somativa.


Avaliação Diagnóstica - Função analítica


O objetivo é entender em que ponto da aprendizagem o aluno está e como evoluir a partir deste ponto..Como o próprio nome sugere, a intenção aqui é - à grosso modo - criar um diagnóstico sobre a turma ou o aluno (conhecimentos prévios, capacidades, habilidades, perfil pessoal, objetivos, etc) e a partir daí criar um plano de ação com estratégias pedagógicas que vão de encontro com as necessidades e expectativas do aluno.

  • Professor identifica a realidade da turma ou do aluno no início de um ciclo

  • Professor levanta dados sobre a performance da turma ou do aluno

  • Professor qualitativa os dados levantados refletindo, por exemplo, sobre os padrões de dificuldades ou as suas causas

  • Professor define as ações necessárias para desenvolver os pontos falhos

Para compartilhar um pouco da minha experiência como coordenador pedagógico de escolas de idiomas: como normalmente há rotatividade de professores entre as turmas (semestral ou anualmente) e também há ciclos a serem concluídos e iniciados (também semestrais ou anuais), a avaliação diagnóstica é praticamente uma rotina (ou pelo menos deve ser) nas escolas de inglês. É necessário fazer sempre uma avaliação quando um professor vai iniciar um ciclo com uma turma nova ou quando a turma vai iniciar um ciclo novo, ou quando há uma atualização de material, por exemplo.


Pessoalmente, uso a avaliação diagnóstica fundida com a avaliação formativa. Desta maneira consigo seguir um ciclo de levantamento e análise de dados, planejamento de ação, desenvolvimento da ação e avaliação da mesma resultando em uma evolução sistemática e visível tanto para o aluno quanto para o professor.


"Para que a avaliação diagnóstica seja possível, é preciso compreendê-la e realizá-la comprometida com uma concepção pedagógica. (...) esta concepção está preocupada com a perspectiva de que o educando deverá apropriar-se criticamente de conhecimentos e habilidades necessárias à sua realização como sujeito crítico (...) A avaliação diagnóstica não se propõe e nem existe uma forma isolada. É condição de sua existência e articulação com uma concepção pedagógica progressista". (LUCKESI 2003, p.82).


Avaliação Formativa (ou Processual ou Cumulativa ou Sistemática) - Função controladora


A característica predominante da avaliação formativa é o acompanhamento contínuo e individualizado do aluno. Há momentos específicos e estratégias pontuais para as situações avaliativas, mas digamos que todo momento é uma oportunidade de avaliação e que este contexto não cria qualquer tipo de tensão, mas sim uma ponte entre as expectativas do aluno e a sua real evolução.


A avaliação formativa não se limita a avaliar um único momento, através de uma única ferramenta para testar uma única habilidade ou capacidade. Ela combina diferentes instrumentos avaliativos para mensurar diferentes aspectos do aprendizado e em diferentes momentos do processo.


De uma ótica pessoal devo dizer que é o modelo de avaliação (somado à outros) que mais se encaixa na minha prática hoje. O primeiro motivo é metodológico. Entendo a avaliação como uma ferramenta que auxilia o processo de aprendizagem, que não tenha caráter punitivo e que ou burocrático. Em segundo lugar, como o atendimento é sempre individual, a avaliação formativa permite um acompanhamento muito assertivo do aluno. É sempre possível situar o aluno dentro das suas próprias expectativas e também dentro das expectativas do curso. Ele consegue enxergar com orgulho aquilo que já aprendeu e com humildade e coragem aquilo que ainda está por ser estudado.


Este tipo de avaliação traz alguns desafios para os professores:

  • Primeiramente, o professor precisa ter muita organização e coerência no levantamento e na qualificação dos dados sobre a performance do aluno. Como é necessário avaliar o processo enquanto ele acontece, o professor deve observar e registrar com frequência informações e possíveis feedbacks.

  • É preciso ter um ótimo canal de comunicação com o aluno. A avaliação formativa constrói-se em grande parte, através da promoção de feedback do professor para o aluno (e também pela via contrária). O professor deve permitir que o aluno tenha conhecimento de todas as informações relativas à sua avaliação: acertos, falhas mais graves, pontos a serem melhorados, pontos que estavam falhos e melhoraram, etc.

Uma forma bacana de chegar a um processo avaliativo formativo de sucesso é pensar que a avaliação ou a prova já começa na aula. Como o professor quer que o aluno seja durante a prova? Participativo! Ok, então é necessário que ele seja participativo já durante a aula. A prova começa antes da prova tanto para o professor (que faz a avaliação contínua) quanto para o aluno (que é constantemente desafiado em diferentes contextos). Quanto mais o aluno se sentir à vontade durante a aula, mais ele se sentirá à vontade durante as provas ou qualquer outro momento avaliativo.


Impressões que eu tive e tenho com esse modelo de avaliação:

  • É necessário se organizar, mas depois de um tempo a avaliação formativa facilita muito o trabalho. Melhor para o aluno e para o professor. O processo fica mais dinâmico, agradável e assertivo.

  • Depois de um tempo há uma certa banalização dos momentos avaliativos (até das provas tradicionais). As provas não perdem a seriedade em seu propósito de avaliar mas acontece uma mudança de perspectiva. Como o aluno e o professor estão sempre trocando feedback e traçando planos de melhoria, os alunos perdem a tensão em relação à punição que normalmente recebem. Basta uma experiência positiva. Por exemplo: um aluno recebe um feedback com um plano de melhora em relação a algum assunto específico. Combina-se um prazo para uma nova troca de feedback. A partir daí são feitos trabalhos específicos sobre aquele tema e claro, feedbacks diários.. É chegada a data de um novo feedback mais pontual e o professor apresenta dados que comprovam ao aluno que aquela melhora foi alcançada. A partir daí o aluno vai percebendo que o processo é confiável e que a avaliação faz parte dele. Há situações em que alunos gostam tanto dessa prática que pedem feedback em todas as aulas.

  • Pode ser necessário usar um tempo específico para um feedback mais pontual. Quando o feedback é muito frequente pode ser que se crie um caráter mais trivial e o aluno não o dê o devido valor. Para este tipo de situação vale à pena construir um momento específico para o feedback e explicar as suas razões.

  • O aluno tem mais aceitação a respeito das suas dificuldades e mais autoestima quando começa a perceber a própria evolução.

“A avaliação formativa tem a finalidade de proporcionar informações acerca do desenvolvimento do processo de ensino e aprendizagem, para que o professor possa ajustá-lo às características dos estudantes a que se dirige. Suas funções são as de orientar, apoiar, reforçar e corrigir”. ( GIL, 2006, p. 247, 248).


“A forma de avaliação em que a preocupação central reside em coletar dados para reorientação do processo de ensino-aprendizagem. Trata-se de uma "bússola orientadora" do processo de ensino-aprendizagem. A avaliação formativa não deve assim exprimir-se através de uma nota, mas sim por meio de comentários”. (BLAYA, 2007).


“A avaliação formativa consiste na prática da avaliação contínua realizada durante o processo de ensino e aprendizagem, com a finalidade de melhorar as aprendizagens em curso, por meio de um processo de regulação permanente. Professores e alunos estão empenhados em verificar o que se sabe, como se aprende o que não se sabe para indicar os passos a seguir, o que favorece o desenvolvimento pelo aluno da prática de aprender a aprender. A avaliação formativa é um procedimento de regulação permanente da aprendizagem realizado por aquele que aprende”. (BONIOL E VIAL APUD WACHOWICZ E ROMANOWSKI, 2003, p. 126).


Avaliação Somativa - Função classificatória


Esta é (infelizmente) a mais tradicional e consequentemente mais conhecida forma de avaliação: as famosas provas bimestrais, semestrais e anuais. O foco da avaliação somativa é pontual, localizado no tempo e espaço. Normalmente todos os alunos são avaliados da mesma maneira e submetidos ao mesmo teste. Este tipo de avaliação traz caráter classificatório e é utilizado em determinados períodos específicos, normalmente ao final de algum ciclo pedagógico. Ela visa verificar o desenvolvimento dos alunos em determinado período e chegar a um nivelamento da turma.


Pessoalmente, apesar de ter sido um aluno relativamente calmo a respeito do assunto provas, sou um dos filhos do trauma do caráter classificatório e da eterna cobrança que existe nas escolas brasileiras. Depois que obtive razões técnicas e profissionais para não gostar deste tipo de avaliação senti que sempre tive algum tipo de sensatez.


A avaliação somativa é excludente e na maioria das vezes não assertiva. Ela analisa pontos extremamente específicos em contextos extremamente específicos. Além disso, muitas vezes estas provas são usadas como motivação para que os alunos estudem. E aqui não posso deixar de expressar que existe pra mim uma inversão completa de valores. A prova acaba criando um tom de ameaça perante o aluno.


Entendo que ela também é reflexo das condições oferecidas pelo sistema educacional. O pouco tempo hábil para o número excessivo de objetivos e atividades acaba sacramentando este tipo de avaliação como o mais viável. Mesmo assim, ainda foco minhas críticas em COMO este tipo de avaliação é utilizado e não no tipo de avaliação em si. Como já mencionado antes, acredito que a avaliação somativa é uma das ferramentas a serem utilizadas durante um processo de avaliação mais completo e mais complexo.


“A avaliação somativa manifesta-se nas propostas de abordagem tradicional, em que a condução do ensino está centrada no professor, baseia-se na verificação do desempenho dos alunos perante os objetivos de ensino estabelecidos no planejamento. Para examinar os resultados obtidos, são utilizados testes e provas, verificando quais objetivos foram atingidos considerando-se o padrão de aprendizagem desejável e, principalmente, fazendo o registro quantitativo do percentual deles”. (WACHOWICZ e RAMANOWSKI, 2003, p. 124,125).


“Uma avaliação pontual, que geralmente ocorre no final do curso, de uma disciplina, ou de uma unidade de ensino, visando determinar o alcance dos objetivos previamente estabelecidos. Visa elaborar um balanço somatório de uma ou várias seqüências de um trabalho de formação e pode ser realizada num processo cumulativo, quando esse balanço final leva em consideração vários balanços parciais”. ( GIL, 2006,p. 248).


Resumindo

​QUANDO APLICAR

CARACTERÍSTICAS E OBJETIVOS PRINCIPAIS

NA PRÁTICA

​DIAGNÓSTICA

No início ou antes do início de algum ciclo pedagógico

- Tem um aspecto preventivo, objetivo e planejado


- Permite que o professor identifique toda a realidade da turma ou do aluno

- Produção e leitura de textos


- Debates e entrevistas


- Análise de dados da turma (consulta ao histórico escolar, por exemplo)

​FORMATIVA

Aplicação contínua: diariamente, ocasionalmente ou periodicamente

​- A avaliação é um processo inserido dentro do fluxo de ensino-aprendizagem


- Uso de feedback para os alunos


- Entende-se que as falhas fazem parte do processo


- Caráter qualitativo


- Identifica características individuais e personaliza o processo e respeita o ritmo de cada aluno


- Feedback através de conversas com os alunos


- Autoavaliação


- Simulados


SOMATIVA

​Ao final de ciclos: provas semanais, quinzenais, mensais, bimestrais, semestrais, anuais

- Promove a classificação dos alunos de acordo com padrões pré estabelecidos - Tem caráter conclusivo - Uso de notas numéricas ou conceitos - Caráter quantitativo - Realizada igualmente com todos os alunos

- Provas e trabalhos finais


- Avaliação final


- Somatório de avaliações realizadas ao longo do ano


O que eu aplico em meu curso?


Tenho comigo que nem tudo é inteiramente bom ou ruim. Como não necessito seguir modelos protocolares ou burocráticos e desfruto de um contexto específico, opto por um CICLO AVALIATIVO no qual posso usar ferramentas de todos os tipos de avaliação e construir com o aluno um perfil de performance sempre demonstrando claramente para mim e para ele todos os pontos de evolução e/ou defasagem. Segue uma ilustração:


CICLO AVALIATIVO:

  • Avaliação diagnóstica: Sempre no começo do curso faço um levantamento sobre os conhecimentos técnicos, culturais e sociais do aluno. Além disso, abordo quais as expectativas e objetivos do aluno com o curso. Este momento é feito através de entrevista, diálogo e simulação de aula. A partir daqui, crio um plano de ação para aquele aluno e passo a aplicá-lo nas próximas aulas.

  • Avaliação formativa: Esta avaliação está presente em praticamente todos os momentos do curso. É este modelo de avaliação contínua que me ajuda a personalizar cada vez mais o ensino do aluno. Em todas as aulas - às vezes várias vezes por aula - é analisado se o aluno alcançou os objetivos comunicativos propostos e a partir daí feito um novo plano de ação, pontual ou a longo prazo, ou para seguirmos em frente ou para sanar as defasagens. As ferramentas mais usadas são troca de feedback e propostas de autoavaliação.

  • Avaliação somativa (quando necessário): Ainda que somente com caráter simulativo, por vezes aplico este tipo de avaliação em duas situações diferentes: para alunos que estão se preparando para testes específicos - entrevistas de emprego ou exames de proficiência, por exemplo - ou para alunos que requisitam este tipo de avaliação.

Lembrando, todas as experiências que divido aqui são pessoais e em contextos específicos. Acredito que cada professor deva adequar as suas avaliações às suas realidades. É necessário muito trabalho, pesquisa e, principalmente, prática para chegar a um processo avaliativo que faça parte do cotidiano de ensino como ferramenta de aprendizado e não como punição. Basta começar!


É importante registrar aqui que a discussão sobre aplicação ou não de provas, importância das provas, modelos de avaliação e tantas outras variáveis poderia durar para sempre. Teríamos que fazer um levantamento de dados imenso tanto das diversas teorias escritas quanto de casos empíricos a fim de avaliar os fatos. Depois disso, esses dados deveriam ser organizados e analisados qualitativa e quantitativamente antes de ensaiar qualquer tipo de conclusão. A minha intenção aqui é apresentar algumas ideias sobre cada modelo de avaliação e dividir as minhas experiências para crescermos juntos.


Quer testar os seus conhecimentos sobre as funções das avaliações no processo de ensino-aprendizagem? Aqui vai um quiz para professores (e alunos curiosos).

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